Os Padres sinodais declararam que o objectivo fundamental da XII Assembléia
foi «renovar a fé da Igreja na Palavra de Deus»; por isso é necessário
olhar para uma pessoa em Quem a reciprocidade entre Palavra de Deus e
fé foi perfeita, ou seja, para a Virgem Maria, «que, com o seu sim à
Palavra da Aliança e à sua missão, realiza perfeitamente a vocação
divina da humanidade». A
realidade humana, criada por meio do Verbo, encontra a sua figura perfeita
precisamente na fé obediente de Maria. Desde a Anunciação ao Pentecostes,
vemo-La como mulher totalmente disponível à vontade de Deus. É a Imaculada
Conceição, Aquela que é «cheia de graça» de Deus (cf. L c 1, 28), incondicionalmente dócil à Palavra divina (cf. L c 1, 38). A sua fé obediente face à iniciativa de Deus plasma cada instante da sua
vida. Virgem à escuta, vive em plena sintonia com a Palavra divina; conserva no
seu coração os acontecimentos do seu Filho, compondo-os por assim dizer num
único mosaico (cf. L c 2, 19.51).
No nosso tempo, é preciso que os fiéis sejam ajudados a descobrir melhor a
ligação entre Maria de Nazaré e a escuta crente da Palavra divina. Exorto também
os estudiosos a aprofundarem ainda mais a relação entre mariologia e teologia
da Palavra. Daí poderá vir grande benefício tanto para a vida espiritual
como para os estudos teológicos e bíblicos. De facto, quando a inteligência da
fé olha um tema à luz de Maria, coloca-se no centro mais íntimo da verdade
cristã. Na realidade, a encarnação do Verbo não pode ser pensada prescindindo da
liberdade desta jovem mulher que, com o seu assentimento, coopera de modo
decisivo para a entrada do Eterno no tempo. Ela é a figura da Igreja à escuta da
Palavra de Deus que nela Se fez carne. Maria é também símbolo da abertura a Deus
e aos outros; escuta activa, que interioriza, assimila, na qual a Palavra se
torna forma de vida.
Nesta ocasião, desejo chamar a atenção para a familiaridade de Maria com a
Palavra de Deus. Isto transparece com particular vigor no Magnificat.
Aqui, em certa medida, vê-se como Ela Se identifica com a Palavra, e nela entra;
neste maravilhoso cântico de fé, a Virgem exalta o Senhor com a sua própria
Palavra: «O Magnificat – um retrato, por assim dizer, da sua alma – é inteiramente
tecido de fios da Sagrada Escritura, com fios tirados da Palavra de Deus. Desta
maneira se manifesta que Ela Se sente verdadeiramente em casa na Palavra de
Deus, dela sai e a ela volta com naturalidade. Fala e pensa com a Palavra de
Deus; esta torna-se Palavra d’Ela, e a sua palavra nasce da Palavra de Deus.
Além disso, fica assim patente que os seus pensamentos estão em sintonia com os
de Deus, que o d’Ela é um querer juntamente com Deus. Vivendo intimamente
permeada pela Palavra de Deus, Ela pôde tornar-Se mãe da Palavra encarnada».
Além disso, a referência à Mãe de Deus mostra-nos como o agir de Deus no mundo
envolve sempre a nossa liberdade, porque, na fé, a Palavra divina
transforma-nos. Também a nossa acção apostólica e pastoral não poderá jamais ser
eficaz, se não aprendermos de Maria a deixar-nos plasmar pela acção de Deus em
nós: «A atenção devota e amorosa à figura de Maria, como modelo e arquétipo da fé da
Igreja, é de importância capital para efectuar também nos nossos dias uma
mudança concreta de paradigma na relação da Igreja com a Palavra, tanto na
atitude de escuta orante como na generosidade do compromisso em prol da missão e
do anúncio».
Contemplando na Mãe de Deus uma vida modelada totalmente pela Palavra,
descobrimo-nos também nós chamados a entrar no mistério da fé, pela qual Cristo vem
habitar na nossa vida. Como nos recorda Santo Ambrósio, cada cristão que crê, em
certo sentido, concebe e gera em si mesmo o Verbo de Deus: se há uma só Mãe de
Cristo segundo a carne, segundo a fé, porém, Cristo é o fruto de todos.
Portanto, o que aconteceu em Maria pode voltar a acontecer em cada um de nós
diariamente na escuta da Palavra e na celebração dos Sacramentos.
EXORTAÇÃO APOSTÓLICA VERBUM DOMINI (BENTO XVI)
EXORTAÇÃO APOSTÓLICA VERBUM DOMINI (BENTO XVI)
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